Ai, há quantos anos que eu parti chorando
deste meu saudoso, carinhoso lar!...
Foi há vinte?... Há trinta?... Nem eu sei já quando!...
Minha velha ama, que me estás fitando,
canta-me cantigas para me eu lembrar!...
Esta quadra extraída de um belo poema do poeta transmontano, Guerra Junqueiro, reporta-me ao dia 30 de Setembro de 1973, o dia em que perfez quarenta anos, que eu deixei pela primeira vez a casa da minha família e a minha aldeia, rumo a Lisboa.
Apesar de ser um desejo, alimentado durante toda a minha adolescência, relembro com um grande sentimento nostálgico o momento em que desci as escadas da casa dos meus pais, com todos os meus haveres dentro de um saco de viagem, e a minha família na varanda acenando um adeus, como se eu partisse para a guerra.
Não estava toda a família, faltava o meu pai que saíra bem cedo de casa, só para não viver esse momento da despedida, porque apesar dos seus quase 100 quilos de peso, era um sentimentalão e disso tive a oportunidade de o constatar anos mais tarde.
Porém, eu ia com o coração cheio de esperança de ir conquistar o mundo, desde logo não ia sozinho, no táxi estacionado no fundo da escada da igreja esperava-me o Sr. Manuel Benedito que seria o meu guia, ele que muitos anos antes, vivera a mesma experiência.
O táxi trouxe-nos à estação onde apanhamos o velho Texas, fazendo depois toda a viagem de comboio até Lisboa, onde na estação de Santa Apolónia, nos esperava o Joaquim Ferrador.
Em Lisboa fui acolhido por uma outra família, embora não de sangue, mas de coração, a família Ferrador, com a qual tenho uma enorme dívida de gratidão.
Graças à ação do Joaquim Ferrador, comecei logo a trabalhar no dia 2 de Outubro de 1973, completando amanhã quarenta anos de contribuinte, para o sistema contributivo da Segurança Social. Face às regras que vigoravam até há pouco tempo, a partir de amanhã eu poderia entrar na situação de reformado, porquanto teria cumprido a minha parte de contribuinte.
Infelizmente as regras alteram-se consoante a vontade dos governos, e as expectativas de vida das pessoas, são agora, viver um dia de cada vez, tal é a incerteza quanto ao futuro. Agora parece que terei de trabalhar ainda mais sete anos, contribuindo assim com 47 anos de descontos para a Segurança Social. Ora conhecendo quem se reformou aos trinta e quarenta anos, apenas porque fez dois mandatos na Assembleia da República, ou um mandato no Tribunal Constitucional, claro que não fico satisfeito.