É vulgar ouvirmos dizer, a minha vida dava um romance, embora isso dependa muito, da nossa idade e das nossas vivências. Os chineses, até costumam dizer que, a realização do homem atinge-se apenas, quando faz um filho, planta uma árvore e escreve um livro.
Embora isso me pareça exagerado, o facto é que todos nós conhecemos pessoas, com histórias de vida mirabolantes que, embora não deem um romance, têm episódios pitorescos, os quais devem ser partilhados.
O meu amigo Manuel Benedito que tal como eu, é um outeiro secano residente em Lisboa, é precisamente uma dessas personagens, e porque tem noventa anos, feitos no passado dia 16 de janeiro, tem histórias de vida, verdadeiramente deliciosas.
Para comemorar o seu 90.º aniversário, o Manuel juntou à sua volta num restaurante nos Olivais, mais de quarenta pessoas, entre familiares e amigos, onde me incluiu.
A certa altura do encontro e como forma de justificar a razão da presença de cada um dos convidados, o Manuel confidenciou alguns dos seus episódios de vida, vivenciados com cada um deles.
No grupo estava um casal natural da Beira Baixa, cujo marido tinha sido seu colega na Carris, onde o Manuel fez o seu percurso profissional e como se diz que a amizade é para a vida, a amizade com esse casal, tem perdurado até hoje.
O Manuel contou então uma história deliciosa que eu não resisto a recontar, de um fim-de-semana, passado na Aldeia de João Pires, concelho de Penamacor, onde esse amigo tinha um primo padre, com um grande espírito folião.
Chegados numa sexta-feira à noite, o padre avisou logo que para a noite de sábado, estava prometida uma grande patuscada. Era altura da desobriga, e como não havia mais nada para fazer, o Manuel acompanhou o padre, como forma de conhecer mais dessa região.
Porém quando chegaram à igreja, o padre foi surpreendido com um número inusitado de fiéi,s dispostos a confessarem-se, ora fazendo um breve cálculo mental, concluiu que isso iria atrapalhar a patuscada, e virando-se para o Manuel disse-lhe.
- Oh Sr. Manuel vista estas vestes e vá para aquele confessionário, pois só pelos dois conseguiremos despachar isto.
O Manuel muito atrapalhado ainda perguntou.
- Mas o que é que eu faço?
Nada disse-lhe o padre, oiça-os só, mas dê-lhe pouca penitência.
O Manuel não teve outro remédio, enfiou as vestes por cima da cabeça e lembrando-se do tempo da sua juventude na aldeia, em que se confessava pelo menos, uma vez por ano, ouviu cinco fiéis, deu-lhes pouca penitência, mas nunca confessou a ninguém, aquilo que ali ouviu.